Marina Bertol Preisler

Confira junto com a Revista MODAA um pouco mais da história do Projeto Jojoca, através da fala desta mulher inspiradora:

“A vontade de ajudar, desde sempre me acompanha e foi com o passar dos anos que aprendi a lidar com esse chamado interno e, principalmente, em saber, como ajudar. Quando tinha uns 12/13 anos levei duas meninas de rua, para dormirem na minha casa. Lembro até hoje que era um dia frio e elas ficaram encostadas no muro da minha casa, e chegou a noite e aquelas duas meninas não saiam dali, até que, mesmo sem a permissão da minha mãe, convidei-as pra dormirem na minha casa. Na minha cabeça era como convidar umas coleguinhas de escola.

O olhar daquelas meninas, uma tinha a minha idade e outra mais nova, nunca saíram da minha mente. Elas nunca tinham tomado banho quente e quando ligamos o microondas elas ficaram olhando impressionadas pra aquilo como se fosse uma TV. Lembro-me da felicidade do banho quente, do microondas, do nescau e do café da manhã. Mas, amanheceu o dia e elas tinham casa para voltar. Levamos elas, era próximo à chácara que meu avô tinha, porém, não as deixamos simplesmente em casa, pois as mesmas tinham medo da reação dos pais, e antes de irem arrumei muitas coisas minhas, algumas cobertas, roupas e o que poderia de alimentos para elas. Nunca mais as vi e as procurei muito! O tempo foi passando e sempre sentia a necessidade de fazer algo por alguém... Aquilo me tocou profundamente. Fazia o que conseguia, solitariamente, e sempre com uma inquietação como se algo além precisava ser feito. Até que em 2015, dentro de uma instituição religiosa, as campanhas foram se fazendo mais presentes e com pessoas com muitas necessidades. E em 2020, numa campanha de Dia dos Pais, pela qual fomos entregar cestas básicas e alguns presentes, eu me encarreguei pelos Bairros São João e Vila São Pedro, e o que me chamou muito a atenção era que quase não havia homens, pais nestas casas visitadas. E na última entrega, eu diria que foi onde nasceu o Projeto Jojoca. Estava no Bairro São João, na casa de uma família extremamente vulnerável, com 3 crianças, que juntamente com a mãe, moravam em cima de uma cama de casal... Senti muita compaixão e naquele mesmo dia trouxe uma das crianças, que tinha 5 anos para a minha casa novamente, para dar banho e comida. Ao devolvê-la, fiz o percurso da volta chorando questionando: por que Deus, uns têm tanto e outros tão poucos?

Aquela cena novamente não saía da cabeça. Aquela casa, sem banheiro, sem comida, sem nada! Não podia fechar os olhos pra aquilo e não fechei. No outro dia, era Domingo, mas lá estava eu, novamente. Convoquei meus amigos, medimos o terreno e pedimos autorização pra família pra construir um lar para eles. E, assim fomos. Contruímos um “puxado” com banheiro, cozinha, quarto e sala. Todo o movimento de material ou marcenaria foram feitos por nós mesmos. Com isso, íamos todos os dias nesta casa, nesta rua, neste bairro e, ao final da construção, as crianças já estavam nos esperando... Começou com três crianças sendo amparadas. Depois 6, e foi crescendo para 9, 12, 15, até que, meses depois, em Fevereiro, quando fizemos a campanha de material escolar, tínhamos 80 crianças nos esperando. Nossas ações eram na rua, literalmente na rua - fazia comida na minha casa e levava pipoca, cachorro-quente para elas e lá ficávamos as tardes com a criançada.

Até que, um dia, chegou outro momento desse chamamento interno, no qual me questionei: “Até quando vamos ficar entregando apenas comida?” Essas pessoas não precisam só de alimento, precisam de esperança e de sonhos. E nisso, virou uma outra chave dentro do Projeto Jojoca, a chave da educação, da cultura e do respeito, movidos sempre pelo amor.

Começamos com uma sala e depois de algum tempo, com duas. Hoje, em dois anos, atuamos na antiga escola do Bairro São João, contemplando 97 famílias cadastradas, totalizando 130 crianças que frequentam o projeto de segunda a quarta, com oficinas de artesanato, oficina do saber, primeiros passos, arteterapia, tae-kwondo, handebol, batuca, coral, tecido acrobático e corrida.

A pergunta que sempre me fazem é: “Quem é o principal mantenedor do projeto?”  

Minha resposta é: DEUS!

Poucos acreditam, mas em muitas noites rezei com lágrimas nos olhos pedindo ajuda, pois não tínhamos como comprar suprimentos básicos. E no outro dia sempre aparecia alguém com alguma doação, sempre com aquilo que estava pedindo em oração.

Nossa luta é diária, perdemos tudo em duas enchentes, mas nunca deixamos de acreditar ou de desanimar. As pessoas falam o que não conhecem e me dói saber que falaram mal daquele “povo”, daquelas crianças tão carentes... Hoje, já percebo algumas mudanças, as crianças já sabem o que é uma profissão, já tem sonhos, e ali naquele bairro pobre hoje há esperança de dias melhores.

Para a maioria das crianças sou uma madrinha e madrinha leva pra casa e cuida, mas, também, educa. É assim que eu, Marina, me proponho a fazer. Por isso, final de semana minha casa é cheia de crianças - porque acredito que se nós mostrarmos que existe sim uma vida diferente da qual eles conheceram e incentivá-los a não aceitarem menos que isso que apresento, e fazê-los acreditar que eles podem, aí sim, eles terão oportunidades de fazer diferente e ter escolhas mais conscientes.

Assim como aquelas meninas me despertaram, me mostrando, sem querer, que existe no mundo muitas pessoas precisando realmente de apoio e que estão pertos de você, espero que talvez esta leitura seja a semente em você, que você se sinta tocado e deixe nascer uma vontade de querer ser uma pessoa a fazer diferença neste mundão, basta decidir.”

 

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